Quando assistíamos os Jetsons (estou falando para aquela geração que via desenhos lá pelos anos 70) e víamos a Sra. Jane Jetson falando com seu marido pelo telefone e vendo-o em uma tela, não imaginávamos que íamos achar o skype uma coisinha corriqueira e precisar pentear o cabelo antes de atender uma chamada…
Vivemos num mundo rápido e lotado de estímulos. Informações em avalanches nos chegam o tempo todo. Muito mais do que conseguimos guardar e muito mais do que queremos realmente saber. O efeito disso tudo sobre nossa capacidade de memória iremos colher lá na frente, neste tempo de agendas que nos dão de presente os horários do médico e afins, os telefones de A a Z, as datas de aniversário de familiares e amigos. Não precisamos mais guardar recados, discussões são decapitadas por uma consulta no Google e quem tem tempo de jogar baralho ou fazer palavras cruzadas para manter os neurônios em forma?
Memória pouco exercitada que vai ficando preguiçosa pela falta de uso e porque tende naturalmente ao declínio com o passar dos anos. Mas a forma de preservar nossas lembranças ainda é a mesma de sempre: parentes, amigos e fotografias. Pais, avós, irmãos e tios são a nossa história, cada um é ou sabe um pedaço, peças de um todo sobre tudo o que veio antes de nós.
Nos últimos anos de vida de minha avó, sempre que a visitava espremia causos antigos. Bom exercício, pois era a memória que lhe tinha restado, já que os acontecimentos recentes desapareciam no ar. O que começou como entretenimento e estimulação mental para ela, acabou se tornando um momento importante para mim, ouvindo-a contar coisas de sua vida em um tempo tão remoto que nem parecia real. Vida de interior, uma galinha de estimação, namoro com aquele lindo alemão que chegou em um cavalo…
Avós deixam lembranças materiais, ainda bem. Essa tem sua história aqui.
E essa, da outra avó, pode ser conhecida nesse post.
Amigos também fazem bem para a memória. São laços que amarram acontecimentos, afetos, aventuras, tristezas e diversão em uma rede que nos constrói. Gente com passados conhecidos, com histórias interligadas e que, cada vez mais, sabe o quanto é bom estar junto para simplesmente lembrar.
E as fotografias? Ficam para o próximo post.
O texto abaixo despertou o texto acima. Escrito pela tia-avó da Maria Amélia, me fez pensar em como desperdiçamos as lembranças de nossos avós e pais, detentores de sabedoria e informações que precisam ser compartilhadas. Pergunte, escute, aprenda, conheça-se através das lembranças de seus familiares.
A velha da família
Toda família deveria ter a sua velha; traço de união entre o passado fugidio e o futuro ignorado, entre os que partiram e os que hão de vir, entre o que foi, o que é e o que será.
Uma velha guardiã de saudades, pastora de sombras. Que conte a história da família, casos que fazem rir, casos que fazem chorar.
Que diga o nome dos desaparecidos, o jeito que tinham, o modo de falar, de olhar, os gestos, as palavras que usavam, daqueles por outros esquecidos ou nunca sabidos, mas que a velha da família guardou no coração.
Uma velha que conheça a gesta familiar, uma velha repositório da tradição, arquivo da gente morta, para consulta dos vivos.
Uma velha que, como um baú de sótão, encerra trapos de vida, farrapos de tempo, coisas imprestáveis, mas que já serviram, belas coisas fenecidas, lembranças perdidas…
Uma velha, que como um álbum de retratos, conserva a imagem, lado a lado, de vivos e mortos misturados.
Os mortos, menos mortos por estarem ali, os vivos, menos vivos, porque sabem que, como os outros, um dia partirão.
Eu sou uma das velhas de minha família e vejo aflita aproximar-se a hora da separação… Quero ter, quando o momento for chegado, uma outra velha a quem passar a tocha que ilumina os recantos do passado.
Ecila
Dezembro de 1989
Imagens: Pinterest, Weheartit e Norman Rockwell
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Oi Jô! Lindos os textos. Me fez lembrar da minha mãe e das estórias que ela me contava da sua infância e de como o mundo era naquela época. Eu adorava. Infelizmente não tenho nenhum objeto antigo que guarde essas memórias. Ultimamente ando muito nostálgica, ás vezes todo esse movimento do mundo pós moderno me sufoca. Queria que a vida fosse mais devagar parapodermos apreciar cada pedacinho dela, sabe igual uma criança que fica lambendo aquele doce gostoso bem devagarzinho para ele não acabar nunca. Bom, mas minha realidade é essa, então tenho que me adaptar a ela. Só me resta criar pequenos momento onde parece que o tempo não passa. Recomendo a leitura de Mil dias em Veneza e Mil dias na Toscana, o segundo fala muito da questão tempo, mas ler o primeiro é fundamental para a leitura do segundo. Vale a pena, tenho me deliciado com eles. Bjs!
Vou procurar esses livros, Vanessa. Obrigada pela dica!
Querida Jô!
O teu post de hoje tocou-me o coração com tantas boas memórias…
Lembrei logo de quando era mais nova e adorava escutar as estórias dos nossos parentes e amigos mais velhos. E eu gostava tanto que ficava horas esquecidas, colhendo aqueles vestígios de um tempo que já se foi… Acho até que por isso mesmo me sinto meio “contadora de estórias”, uma “Forrest Gump” abrasileirada, que ainda acredita no valor incalculável de nossas memórias familiares. E sinto-me hoje orgulhosa em poder contar para os meus filhos as pequenas estórias de nossas avós e bisavós. Sabe Jô,o mais interessante de tudo são esses momentos mágicos em que paramos pra falar de nossas próprias origens, quando o passado da gente se une ao futuro, num gigantesco e iluminado laço de amor.
Lindo o texto da Dona Ecília…
Beijo grande!
Teresa
Oi, Jô! Que bacana este movimento dos pensamentos, que passam de “mim”, para “você”, e aquilo que provocam. É porque além da beleza dos teus textos, apreciei a reação das pessoas que os leram, em especial as da sua própria família. Emoção explícita!! Bonito…
Uma de suas amigas fala sobre “origens”, e me lembrei do cartão do Dia dos Pais, do colégio dos meus filhos. Dizia assim: “Pai significa a origem. E quem se volta para a origem está seguro de si, de sua existência e de sua sobrevivência.”
É isso aí! Nossas memórias consolam o coração, fortalecem o caráter e firmam os passos! Um beijo.
Somos essencialmente memória…
Sem ela não seríamos nada… andaríamos à deriva!
Lindo post…sempre bom recordar! Infelizmente tenho poucas memorias da minha vó materna, na verdade tenho apenas uma memória. Ela faleceu qdo eu ainda tinha 5 anos, bem novinha…Minha avó paterna tenho mais memórias, mas infelizmente não convivemos tanto assim. As vezes queria poder voltar no tempo e aproveitar mais as pessoas que já foram; não aproveitar no sentido de us’a-la, claro, rs…no sentido de ter passado mais tempo com elas. Infelizmente, aprendemos isso na marra e com o amadurecimento. Qdo somos criancas não entendemos direito a questão vida x morte e só queremos brincar!!
Mas o importante que aprendemos a tempo de aproveitar as pessoas que ainda estão vivas e claro, já ir criando memórias gostasas delas!
Ah…eu assisti muuuito os Jetsons e adorava o telefone deles…ainda bem que de alguma forma isso ficou acessivel pra nós! Não consigo imaginar viver tão longe da minha familia sem o msn/skype!!!
Beijinhos e belo post!!
Mariana, você é muito sensível, em tempo percebeu que a gente tem que fazer certos esforços para preservar lembranças.
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[…] sabe que aprecio coleções, que valorizo memórias, que sou a favor de guardar o que compõe nossa história. Mas como também acredito muito em consumo consciente, acervo de livros passou a ser algo que […]
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[…] ficando esquecida. Já nem me lembro de quantas vezes toquei nesse assunto por aqui. Em certa medida, me incomoda. Me imagino daqui a alguns anos, olhando em volta sem saber […]